segunda-feira, 5 de março de 2012

Joia rara

Time em ascensão técnica versus equipe que necessita do triunfo tal qual um nômade no deserto. O roteiro que se repete ad nauseum pelo mundo afora costuma pregar algumas peças. Mas dificilmente isso aconteceria ontem no estádio Alberto Oliveira. E não aconteceu.

Não aconteceu mesmo com o tabu de único estádio que o visitante jogara e não havia conseguido o triunfo neste campeonato. Não aconteceu mesmo com a possibilidade temerária de relaxamento pela liderança isolada na tabela. Não aconteceu mesmo com as lembranças pouco saudosas de 2008, ano que o visitante mandou seus jogos naquela praça esportiva. Não aconteceu mesmo com o sol inclemente e o gramado indecente que igualam por nível dificuldade o controle de bola e a velocidade da peleja. O sobrenatural do Almeida, a combinação errática dos astros, o imponderável que acompanha o esporte bretão, ontem, na Princesinha do Sertão não aconteceu.

Não aconteceu porque o visitante líder, invicto a 11 rodadas, melhor ataque e aproveitamento da competição não permitiu que acontecesse. O abismo técnico entre os times, previsível e visível costuma sumir nestas condições, pela dedicação extrema do lado do mandante e relaxamento do favorito. Mas o Bahia, com uma atuação inteligente, soube dosar a intensidade do confronto e sem correr grandes riscos controlou a contenda conforme lhe aprazia, suficiente para minar as chances do débil Touro do Sertão.

Tal era a facilidade em ditar o ritmo do match, que a dúvida de quem acompanhava a transmissão da partida, como eu, era de em qual momento o Esquadrão abriria o placar e quem realizaria o feito. Não demorou a aparecer a resposta. Dezoito minutos, Júnior. abre com bela combinação de drible e chute após assistência com as mãos de Madson. O diabo louro, aliás, vem segurando a titularidade graças à eficácia. É decisivo na área com bom aproveitamento nas finalizações. Tecnicamente ainda não agrada e parece deslocado do jogo coletivo do time.

Madson merece um parágrafo a parte. Tem jogado muito bem – ao contrário do que eu tenho lido em algumas publicações – porém é pertinente algumas ressalvas: Não tem jogado com a desenvoltura que atuava nos juniores – e é uma estupidez cobrar isso, jogo profissional é outro ritmo com outra dinâmica de jogo – mas tem sido extremamente seguro na defesa, cumprimento exemplarmente a cobertura por dentro quando o zagueiro sai pra dar combate. Aparece para saída de bola, chega com facilidade no apoio e se posiciona bem na marcação sem a bola. Falta caprichar nos cruzamentos quando chega na linha de fundo, quando o fizer será um lateral completo. O problema é que nos acostumamos a cobrar “laterais-ala” que ataquem todo jogo, muitas vezes irresponsavelmente. No esquema de Falcão alas tem a mesma responsabilidade ofensiva dos volantes. Madson vem amadurecendo muito mais rápido que Ávine, que levou três anos para se tornar um lateral confiável.

Ademais o tricolor da capital controlou o jogo a seu bel prazer e não fosse o arqueiro Rodolpho – inspiradíssimo – o placar teria sido sacramentado já na primeira etapa. Destaque nesta etapa para Magno, novo titular da 10, e para William Matheus que machucou-se justamente quando vivia seu melhor momento no clube. Uma pena.

O Fluminense precisava mudar de postura e mudou. Como é costume das equipes de Ferreira – derrotado três vezes na competição pelo Bahia – após a cancela aberta, time adiantou suas linhas e por certos instantes obrigou o Bahia a ficar mais contido. Isso não evitou que o time da capital chegasse ao ataque em condições de marcar. Vander e Magno desperdiçaram chances bisonhamente, até que a dupla Lenine – Gabriel em boa combinação decretasse o resultado final da contenda.
Menino Gabriel: Sutileza com a 8. Joia rara.

A finalização do menino Gabriel também merece outro parágrafo. Movimenta-se por dentro como meia, infiltra por trás da zaga como atacante, recebe a pelota, visualiza a saída do goleiro, escolhe o canto, dá um toque leve e sutil [ops, ele é camisa 8 também, alô marquetingue do Bahêa] por baixo da bola que encobre Rodolpho e mansamente procura abrigo na grama do fundo do gol antes de resvalar por dentro da rede lateral da meta.

Um gol de quem conhece a bola. Apesar de não ter temporadas treinando fundamentos na divisão de base – como Vander e Magno – Gabriel aprendeu a tratar a redonda em campos de várzea como aquele que chamam de gramado no Jóia.

E pra fazer um gol dessa qualidade num pasto como aquele, tem que ser joia rara.




PS¹: Angione teria pegado o contato do goleiro do Flu. Muito apropriado. Independente da grande atuação de ontem, Rodolpho tem feito um grande campeonato. Só espero que não seja um plano B para a não renovação de Lomba.

PS²: Não fiz análise tática porque o Bahia manteve o sistema dos últimos jogos e a transmissão da TV Bahia muito fechada na bola dificultou a observação do confuso sistema do Flu de Feira. Também acredito que pouco acrescentaria face a facilidade que foi envolvido o time que agora ocupa a penúltima colocação do campeonato.

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